No dia 7 de fevereiro, uma segunda-feira, depois de denunciar a mãe, a ex-modelo Cristina Mortágua, à polícia por agressão física e psicológica, Alexandre Mortágua entrou no quarto da casa que dividia com ela e recolheu suas coisas. O adolescente pegou seus 79 livros de arte e fotografia, encheu algumas malas de roupa e foi embora. Deixou computador, televisão, móveis, tudo para trás. Desde então, ele vive na casa da avó materna, Neide Mortágua, de 67 anos, no subúrbio de Vila Valqueire, no Rio.
Na rua da avó moram seus padrinhos, que o acolheram e o matricularam em sua nova escola, também em sua rua, onde ele dará início pela segunda vez ao primeiro ano do ensino médio. O quarto que vai ocupar no apartamento de Neide já tem uma cama kingsize recém-comprada por Alexandre.
O jovem está ciente de que uma nova vida começou para ele. Apaixonado por moda, vai inaugurar em março o site “Lady In Furs”, especializado em tendências. Aos 16 anos, Alexandre não só sabe fazer moldes, como tem duas máquinas de costura industriais que servem para confeccionar e customizar as roupas que usa. As amigas adoram as blusas feitas por Alexandre, que, recentemente, adquiriu várias peças num brechó em Londres. Sua última excentricidade foi um short e uma blusa do seu xará, o estilista Alexandre Herchcovitch, por R$ 850,00, graças a um desconto do vendedor da loja.
Na entrevista que segue, Alexandre fala de sua primeira experiência homossexual, aos 13 anos, com o melhor amigo, do relacionamento conturbado com o pai, Edmundo, e da certeza de que um dia voltará a falar com a mãe.
- Querendo ou não, ela foi a única que lutou por meus direitos. Quando eu nasci, não tinha pai.
Como você está depois dessa confusão?
Alexandre: Carregava um peso muito grande. Não me sinto aliviado porque não acabou ainda (Alexandre entrou com um processo pedindo a transferência da guarda para a avó, Neide Mortágua).
Que dificuldades você enfrentava com sua mãe no dia a dia?
Ela era uma pessoa de altos e baixos e cada dia estava com um humor diferente. Eu compreendo. Ela já foi a mulher mais bonita do Brasil e hoje está com 40 anos. Antes, ela tinha todo o dinheiro que podia e queria gastar, hoje não é mais assim. Querendo ou não, é uma coisa difícil para ela. Por causa disso, vieram suas crises. Esse foi um dos principais motivos para eu ter ido morar com a minha avó.
Vocês brigavam muito?
Não, eu nunca levantei a voz, nem nunca bati na minha mãe. A única vez que falei ‘pronto, agora chega, vou fazer alguma coisa’, foi essa vez.
Você também reclamou que não tinha acesso a pensão do seu pai (Desde o nascimento de Alexandre, Cristina briga na justiça para o jogador Edmundo reconhecer o filho).
Sim. Agora minha pensão esta guardada e vai direto para a poupança. Minha pensão é muito boa e dá para viajar para o exterior duas vezes ao ano. Antes eu não podia. Não tinha acesso ao dinheiro. Ganhava uma mesada de R$ 300 dela. Nunca me faltou nada. Ela sempre foi uma mãe excelente. Mas eu fui privado de coisas que eu poderia ter tido e não tive.
Quem é você, Alexandre?
Sou um adolescente como qualquer um que vai para escola, faz curso de inglês, tem suas responsabilidades, mas é um adolescente diferente. Sem querer me achar melhor do que os outros, não sou como a maioria que só se preocupa em sair, beber e só. Minha mãe me contava que quando eu fiz 12 anos eu já perguntava como poderia fazer para estudar moda. Cresci cercado no ambiente da moda, conheço esse vocabulário. Foi minha mãe quem me influenciou.
Por que você se julga um adolescente diferente?
Nenhum adolescente tem o desejo de fazer 18 anos para sair de casa e começar a estudar. A maioria quer continuar na casa do pai e ser sustentada por ele. Ainda mais quando o pai tem dinheiro. Eu nunca quis ser jogador de futebol nem quis ser modelo. Sou muito diferente dos meus pais. Minha mãe sempre falava: ‘Um dia eu e seu pai vamos ser conhecidos como os pais do Alexandre Mortágua’.
Como foi a infância com sua mãe, longe de seu pai?
A convivência com a minha mãe sempre foi boa. Ela sempre foi mãe e pai ao mesmo tempo. Ela conta que meu pai me visitou até os 4 anos. Não sei por que ele parou. Acho que por causa de suas viagens de trabalho acabamos nos distanciando (Edmundo jogou em Tókio e na Itália). Nunca tive um vínculo muito forte com ele.
Você sente falta do seu pai?
(Nega com a cabeça) Acho que a gente só pode sentir falta quando a gente perde. Eu nunca tive.
Você o procura?
Já o procurei em várias ocasiões. A gente conversava sempre por telefone e raramente ao vivo. Ele ligava de São Paulo, dizia que quando chegasse ao Rio ia me ligar para a gente se encontrar, eu esperava a ligação e ele nunca ligava de volta. Com 15 anos desisti. Ele não me ligava no Natal, não ligava no meu aniversário. Mas hoje eu consigo ver que foi por causa dessa rixa dele com a minha mãe que ele acabou se distanciando de mim. Tenho a certeza que agora que não tenho ‘aquela’ relação com a minha mãe, ele vai voltar a me procurar.
Quando foi a última vez que você ligou para o Edmundo?
Em dezembro de 2009 quando a Catarina, a filhinha dele, nasceu. Saí e fui comprar um presente para ela e para ele, pois sabia que ela tinha nascido há pouco tempo. Não consegui falar com ele e não entreguei o presentinho. Está guardado lá em casa.
Como foi deixar a Barra da Tijuca e ir morar com sua avó na Vila Valqueire, subúrbio do Rio?
Minha família toda é de lá – madrinha, padrinho, todos moram na mesma rua da minha avó. Quando eu disse que queria morar com a minha avó, minha madrinha foi a primeira a me apoiar. Está sendo difícil porque a maioria dos meus amigos mora na Barra e na Zona Sul. Mas ainda está dando.
Depois que a denunciou à polícia você voltou a falar com a sua mãe?
Não.
Tem vontade de procurá-la?
Não, agora não.
Como você descobriu a sua homossexualidade?
Minha mãe sempre foi cercada de muitos gays e isso se tornou uma coisa muito natural para mim, desde pequeno. Eles conversavam entre eles, eu ouvia tudo como se fosse conversa de mulher falando de homem. Meu primeiro beijo homossexual foi com meu melhor amigo, eu tinha 13 anos. Fiquei com ele pela primeira vez e achei que fosse só curiosidade. Aconteceu de novo e vi que era isso que eu queria. Nunca encarei como uma coisa ruim, como se fosse vergonha. Quando contei para minha mãe, ela pediu para eu não contar para ninguém. Mas o mundo é gay. Ela tentou usar isso contra mim na declaração, mas quem já me conhece sabe que eu sou gay.
Você já se envolveu com mulher?
Já me envolvi com mulher, mas foi estranho.
Já teve relação sexual com mulher?
Não, nunca transei com mulher.
Você pensa em reencontrar seu pai?
Amo, respeito meu pai. Ele é meu pai, ponto. Não tenho convivência com ele. Se tiver que reencontra-lo será com o maior amor do mundo.
Qual é o futuro que você enxerga daqui para frente?
Para me fazer passar por tudo isso, acredito que a vida tem alguma coisa muito boa para mim. É a única motivação que eu tenho para não desistir de tudo.
Da onde vem essa garra?
Da minha mãe. Querendo ou não, ela foi a única que lutou por meus direitos. Quando eu nasci eu não tinha pai. Foi ela que brigou, que fez o teste de DNA, lutou 13 anos na justiça para eu ter meu apartamento que hoje está comprado na planta e fica pronto quando eu faço 18 anos. Ela nunca pensou em desistir dos meus direitos.
Você acha que um dia vai se entender com a sua mãe?
Com certeza.
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